Sou Tarso Oliveira, gaúcho de Porto Alegre, homem negro e empreendedor social. Minha jornada não começou com a fundação de empresas ou a coordenação de fundos, mas sim com uma percepção poderosa, ainda na juventude: a de que a desigualdade não é uma teoria, mas uma experiência cotidiana.
Cresci em uma realidade onde talento nem sempre era sinônimo de oportunidade. Talvez por isso eu tenha aprendido, cedo, a transformar obstáculos em movimento.
A dança foi meu primeiro instrumento de transformação. Aos 21 anos, esse movimento me levou do Sul para o Rio de Janeiro, para a faculdade de Dança na UFRJ. Esse deslocamento não foi apenas geográfico; foi uma busca interna por me afirmar, me descobrir e conquistar a autossuficiência necessária para enfrentar o mundo.
Da Arte ao Empreendedorismo de Impacto
Depois da universidade, o palco mudou. Percebi que o meu próximo “espetáculo” seria no universo do empreendedorismo de impacto. Foi assim que nasceu a Troca, uma startup dedicada a desenvolver tecnologia para acelerar a diversidade e a inclusão em ambientes corporativos.
A ideia era ambiciosa na sua simplicidade: criar uma plataforma que ajudasse as organizações a entender e transformar suas práticas de diversidade de forma inteligente, usando dados, diagnósticos e ferramentas de gestão.
Em poucos anos, a Troca impactou mais de 50 grandes corporações no Brasil, inserindo um tema sensível como diversidade na linguagem dos negócios. Criamos um SaaS (Software as a Service) que transformou cultura em métrica e propósito em processo. E mais: provamos que a inclusão não é apenas uma pauta de Recursos Humanos, mas uma estratégia de sustentabilidade e competitividade.
O Chamado da Reconstrução: Liderando o RegeneraRS
Em 2024, uma nova e dolorosa travessia se impôs. As enchentes históricas devastaram o Rio Grande do Sul, tirando casas, referências e esperanças de milhares de famílias. Voltei meus olhos para o Sul com o senso de urgência de quem sabe que o impacto precisa ser coletivo.
Fui convidado a liderar o RegeneraRS, um fundo filantrópico catalítico criado para reconstruir e regenerar o estado. Hoje, gerimos mais de R$ 40 milhões, articulando governos, empresas, fundações, universidades e organizações locais. Nosso trabalho vai além de reconstruir pontes e casas; buscamos reconstruir a confiança e o futuro da população gaúcha.
Coalizão RS: O Poder da Ação em Rede
O RegeneraRS foi o ponto de partida para um movimento ainda maior: a Coalizão RS. Trata-se de uma ampla articulação de atores públicos e privados que acreditam que o Rio Grande do Sul pode se tornar uma referência global em processos de reconstrução.
É um projeto de longo prazo, que une inovação, impacto e governança — pilares que aprendi a respeitar desde os tempos da Troca. Ser o coordenador executivo desse movimento é uma honra e uma responsabilidade imensa. É liderar sem esquecer de onde vim; é construir futuro sem apagar a memória. Em essência, é construir pontes em vez de muros.
Lições de uma Trajetória Entre Mundos
Minha jornada do palco para o ecossistema de impacto me ensinou que a transformação duradoura segue alguns princípios fundamentais:
1. Transforme dor em projeto.
As maiores ideias nascem de inquietações reais. A Troca nasceu da dor da exclusão; o RegeneraRS, da dor da destruição. Em ambos os casos, a dor não me paralisou; foi o combustível para a ação concreta.
2. Liderança é escuta antes de fala.
Em conselhos, comitês e salas de reunião, aprendi que liderar é, antes de tudo, ouvir com empatia e, só então, falar com propósito. O verdadeiro poder está em conectar visões diversas em torno de uma missão comum.
3. Inovação é disciplina, não improviso.
Muita gente confunde criatividade com caos. A inovação que transforma — seja em diversidade ou em reconstrução — exige método, governança e métricas claras. É isso que atrai e sustenta investidores, fundações e parceiros.
4. O propósito precisa caber na planilha.
Idealismo sem execução é apenas um sonho. Execução sem propósito é mera rotina. O equilíbrio entre os dois é o que sustenta negócios e transformações de longo prazo.
5. Nunca esqueça quem abriu o caminho.
Cada conquista minha é coletiva. Da minha mãe aos mentores que acreditaram em mim, das comunidades que me inspiraram às pessoas que resistem todos os dias. É nelas que encontro o sentido do que faço.
O Segredo da Rede: Construir Juntos
No fim das contas, atuar em rede é um segredo fundamental. Foi crucial me conectar e explorar parcerias para dar o próximo passo, construir o próximo projeto e alcançar o próximo resultado.
Entendi que a mudança é intrinsecamente coletiva. Podemos, sim, gerar impacto sozinhos, mas a transformação só acontece quando construímos juntos.
De Tarso Oliveira